sábado

D01.00:57

Acendi a luz do candeeiro ao lado da cama. A lâmpada é de baixa potência. Utilizo-o principalmente para ler. É preto e está apoiado no chão. O seu corpo fino e curvado como o pescoço de um ganso. Demorei algum tempo até afastar todos os pensamentos que me acompanhavam naquela noite irregular. Tinha que me concentrar no meu objectivo: levantar-me e investigar o que tinha causado o barulho que me despertou algum tempo atrás.
Abri a porta do quarto. Apesar da noite ser quente, o ar exterior ao meu quarto tem uma frescura intimidadora. Penso em voltar atrás e vestir mais qualquer coisa... uma t-shirt talvez. Mas receio perder a determinação que agora tenho e dou mais alguns passos em frente. Consigo percorrer toda a minha casa sem qualquer iluminação. Sei perfeitamente onde se encontram todos os objectos, toda a mobília, todos os elementos momentaneamente fora do lugar. Chego à cozinha e acendo a luz de novo. Olho rapidamente para chão. Nada de estranho. Nenhum insecto, nenhum intruso. Investigo por momentos todo o chão. Depois o balcão, o fogão, os armários, o frigorífico... nada de anormal. Tudo está precisamente no mesmo lugar e com as mesmas características de sempre. Apenas a minha presença está diferente. "Porque estou tão incomodado por aqui estar? Na minha própria cozinha?" pensei. Odeio esta noite por isto. Odeio ter perdido a completa segurança e conforto do meu lar. Odeio. Sinto-me nu e vulnerável.
Oiço algo lá fora, nas escadas. Dirijo-me até à porta de saída e escuto atentamente. Parecem-me ser duas pessoas a discutir em sussurro, forçadamente tentando impedir que mais alguém os oiça. Parece-me ouvir o meu nome. Parece-me ser um homem e uma mulher. Cuidadosamente abro a porta. A luz está apagada, é impossível identificá-los. Consigo ouvir melhor. Ela repete o meu nome mais uma vez. Não consigo, no entanto, compreender as outras palavras. "Será uma outra língua?" pensei.
A luz acende-se. A mulher está a olhar para mim. A outra pessoa que estava com ela desapareceu. Não sei o que fazer. Não me consigo mover. Ela diz algo que não consigo ouvir. Vejo o seus lábios vermelhos e húmidos mexerem mas parece que nenhum som é produzido. Continuo paralisado. Observo-a. Ela parece ter pouco mais de vinte anos. É morena, tem o cabelo longo e liso. A pele é extremamente branca. A cara é magra. Parece ter uma pele suave e sedosa com alguns sinais dispersos. Está vestida com um vestido cinzento, justo, e com meias de rede pretas. Acabou de falar e afastou-se apressadamente. Consegui mover-me. Fui atrás dela. Desci as escadas chamando por ela, pedindo-lhe que parasse. Quando cheguei à porta de saída vi-a afastar-se cada vez mais, num passo acelerado. Estava de boxers e em tronco nu, não podia sair assim.

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